The flap of a butterfly’s wings in Brazil set off a tornado in Texas.

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terça-feira, 19 de outubro de 2010

Cenas dos próximos capítulos

Reunido em Conselho Nacional, o PSD faz saber o que é que o PS e o Governo têm que fazer para que o Orçamento de Estado seja viabilizado. Em resposta, o PS diz que não aceita uma negociação condicionada à partida. Passos Coelho não diz se deixa o orçamento passar ou não, mas adianta que o PSD tem que estar preparado para tudo e que assumirá as suas responsabilidades. Qual o próximo episódio?

Bem, Passos Coelho propôs, finalmente, alguma coisa. Já era tempo, uma vez que não podia apenas criticar o Governo e não apresentar alternativas. Falta apresentar medidas para o corte na despesa, mas ainda tem algum tempo para o fazer. Seja como for, já vai sendo hora de mostrar soluções.

Com a posição que assumiu hoje, Passos Coelho deixa claro que, agora, se o orçamento não passar, a culpa não será dos social-democratas. Depende agora do Governo haver ou não negociação. Contudo, pelo que temos visto nos últimos tempos e pela prepotência que Sócrates tem mostrado desde que é Primeiro-Ministro (ainda não se convenceu que não tem maioria absoluta), não vejo grande perspectiva de cedência por parte do executivo.

Ora, se o governo não ceder perante a proposta do PSD, já se sabe que o orçamento não passa. Porque não acredito que Passos Coelho volte novamente atrás e viabilize um orçamento que não contemple a sua proposta. Por outro lado, custa-me a crer que o Governo aceite, por exemplo, que o IVA suba apenas 1%. Assim sendo, dia 29 de Outubro Sócrates apresentará mesmo a sua demissão.

A minha convicção para este desfecho é apenas uma: Passos Coelho demonstrou hoje que assumirá o governo se assim for necessário. Deu ainda uma hipótese a Sócrates para negociar. Mas Passos Coelho prevê que Sócrates não aceite todas as quatro condições. E, ao apresentá-las, o líder do PSD fica sem margem de manobra para as negociar. É muito simples: ou estas medidas são contidas no orçamento, ou não há orçamento.

Depois de assistir a estes últimos desenvolvimentos, volto a acreditar que o Orçamento de Estado não será aprovado. Sabemos todos quais as consequências que isso terá. Sabemos que o PSD será acusado de ter agravado a situação e aliado uma crise política a uma crise económica e financeira. Porém, se com o Governo a cair e o PSD assumir o executivo, talvez o desfecho não seja tão mau como se prevê. No fundo, pior do que estamos é difícil ficar.

Não podemos prever qual irá ser o resultado da votação no próximo dia 29. Podemos apenas tentar imaginar. Assim sendo, quais serão as cenas dos próximos capítulos?


Lisboa, 19 de Outubro de 2010

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Brincadeiras de crianças

Ao ouvir esta noite o debate “Prós e Contras” fiquei com a sensação que, às vezes, a RTP faz verdadeiro serviço público de televisão. E não apenas pelo tipo de programa que é, mas sobretudo pelo conteúdo que teve hoje. Quando se juntam três antigos Presidentes da República e o Reitor de uma grande universidade, o resultado não pode fugir muito de uma lição para o país.

Sampaio até disse que não estava ali para dar aulas a ninguém, mas a verdade é que se prestássemos atenção ao que disse, bem como aos seus companheiros de análise, teríamos muito que aprender. Qualquer um dos presentes tocou com o dedo na ferida, à sua maneira. E com todos concordei. E ainda com Henrique Granadeiro que, da plateia, fez também ele uma intervenção brilhante.

Deste debate/conversa tirei duas ilações principais: 1) ao contrário do que se diz e apesar da crise ser grave, não é o fim do mundo e 2) andamos a brincar aos países e às repúblicas.

Como bem referiram os antigos PR, haja ou não Orçamento de Estado, venha ou não o FMI a Portugal, caia ou não o Governo, toda esta situação há-de passar. Aliás, este é um pensamento muito português: depois da tempestade vem a bonança. Ainda que nas últimas décadas pouca tenha sido a bonança, como diz Sampaio, é preciso pensar positivo.

Porém, apesar desta ser uma das conclusões que tiro do debate, não concordo forçosamente com ela. É verdade, sim, que não é o Apocalipse. Mas a situação é grave e poderá ficar muito grave se o OE não for aprovado. E não podemos ignorar isso. Não podemos assobiar para o lado enquanto uns milhares fazem greves e manifestações. Não podemos fingir que é só mais um episódio de uma novela chamada “Crise”. Apesar de estarmos em crise há não sei quantos anos e de ser cada vez pior (Inês Pedrosa até sugeriu que se arranjassem outros nomes, porque os quantificadores começam a escassear), um dia vamos memos bater no fundo. E esse dia está perto. E digo isto não propriamente porque as condições de vida vão ser muito piores, mas sim porque se vão manter muito más por muito tempo, porque vai ser muito difícil reerguermo-nos.

Por outro lado, referiu Henrique Granadeiro que os políticos portugueses parecem crianças a brigar. Um que provoca o outro e o outro que faz birra e amua. Na situação em que nos encontramos, isto é intolerável. Toda a gente já sabe que Sócrates é um incompetente e que nunca devia ter sido Primeiro-Ministro. Mas se Passos Coelho quer fazer algo pelo país, então que ponha isso de lado por um momento e deixe o Orçamento passar. Porque um Orçamento de Estado é relativamente fácil de reverter, mas a desconfiança dos mercados internacionais é bem mais complexa.

Jorge Sampaio disse, esta noite, que a política precisa de gente nova, de caras novas, de ideias novas. Granadeiro explicou porquê. Eu estou totalmente de acordo. Temos políticos velhos, estruturas obsoletas e os poucos novos que aparecem são piores que os velhos.

A revolução não é a solução. Pelo menos a revolução de armas na mão. Mas é imperativo que haja uma revolução nos costumes, na postura dos cidadãos, no interesse pelo país, para que andemos para a frente. No fundo, os políticos são apenas o reflexo do país que temos. E a única forma de sairmos da crise é mexendo-nos, pressionando, lutando e apresentando ideias.


Lisboa, 11 de Outubro de 2010

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Chuva

O Inverno começou a bater à porta. A chuva começa a cair e o vento a soprar as copas das árvores. Os dias vão ficando mais curtos, mais escuros, mais tristes.

Em Portugal, estamos no Inverno há bastante mais tempo do que apenas uns dias. Alguns países passaram por uma tempestade e já começam a enfrentar a bonança. Por cá, continuamos com o tempo invernoso e ainda não vimos um ténue raio de sol por entre as nuvens.

Culpamos a conjuntura económica, que é culpa da conjuntura política e que influencia a conjuntura social. Mas, na verdade, a economia e a política não passam de desculpas e subterfúgios para algo que custa muito mais admitir.

Na verdade, o ser humano é e terá sempre que ser superior aos números. A nossa condição não se pode reger apenas por critérios económicos e/ou numéricos, ou corremos o risco de perder a nossa singularidade e superioridade. Aquilo que nos faz ser especiais é precisamente o que cada um tem de particular. E assumirmos a sociedade como um todo uno e homogéneo não é mais do que apagar a individualidade de cada um.

Culpar a economia por todos os males do mundo, é descartar as culpas que todos e cada um de nós tem. A economia não é mais que um sistema ao qual pertencemos, mas não é “o” sistema, nem tão pouco o mais importante. Como não o é nenhum sistema social. Os sistemas sociais são apenas isso mesmo: um aglomerado de indivíduos que partilham uma actividade e/ou objectivo.

Mas um sistema não pode condicionar todos os outros nem os indivíduos que dele fazem parte. Pelo menos, um sistema como o económico, que vai pouco mais além dos números e que não trata efectivamente de indivíduos.

Como defende uma teoria social, o sistema, o todo, deverá ser mais que a soma das partes. Por isso, o sistema económico não pode ser apenas um aglomerado de indivíduos. Antes, cada indivíduo, com a sua singularidade e unicidade deverá ter a capacidade de o influenciar. Contudo, colocando a responsabilidade de liderar o sistema nas mãos de um pequeno grupo, estamos a perder esse poder inerente à condição humana, que é o de, de facto, ser uma força motora da sociedade.

Assim sendo, na verdade, só depende de nós ter um futuro mais risonho à frente. Dirão, não desprovidos de razão, que não se vive de sonhos e o que dinheiro é fundamental. Certamente que sim, isso é inquestionável. Mas não é a sua falta que nos deve fazer esmorecer, parar de lutar e procurar soluções. Não somos uma massa amorfa incapaz de tomar decisões. Pelo contrário, somos um grande grupo de indivíduos cada vez mais instruído, com ideias, com capacidade empreendedora, como força para progredir.

No meio deste Inverno chuvoso que vamos atravessando, talvez não dependa exclusivamente de nós fazer com que a chuva pare. Mas, pelo menos, podemos abrir o guarda-chuva.


Lisboa, 6 de Outubro de 2010